09 março, 2010

Dia Mundial da Água-Professor da USP dá dicas para utilizar melhor a água

Cinco de junho é o Dia Mundial do Meio Ambiente. A preservação da natureza deixou de ser uma preocupação somente dos ambientalistas para ocupar os noticiários diários em todo o mundo. As atividades humanas, principalmente no último século, têm ocasionado problemas de degradação ambiental que já estão comprometendo as condições de vida no nosso planeta

Segundo relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, divulgado nesta segunda-feira, 40% da população mundial poderá ser afetada pelo derretimento da neve e de geleiras nas montanhas da Ásia, ocasionado pelo aquecimento da temperatura. Entre os impactos previstos estão mudanças na disponibilidade de água potável e aumento do nível do mar, que afetará áreas costeiras e ilhas.

A boa notícia é que a preocupação com o clima tem crescido em todo o mundo. Pesquisa realizada online pelo Instituto de Mudanças Ambientais da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e pela empresa Nielsen, divulgada hoje mostra que entre outubro de 2006 e abril deste ano, a porcentagem de pessoas que se mostram preocupadas com o meio ambiente saltou de 7% para 16%.

No Brasil os números são ainda mais animadores; 24% dos brasileiros que participaram da pesquisa se mostraram preocupados com o futuro ambiental do planeta. A pesquisa foi realizada com mais de 26 mil usuários da internet em 47 países da América do Norte, Europa, Ásia e Pacífico, América Latina e Oriente Médio.

Durante o bate-papo no UOL News, nesta terça-feira, o professor do Departamento de Hidráulica da Universidade de São Paulo José Carlos Mierzwa disse que embora o Brasil detenha 13% dos recursos hídricos superficiais disponíveis, a água, assim como a população, está mal distribuída pelo país; na região norte, por exemplo, estão quase 70% de toda a água e 7% da população

Por outro lado, no sudeste estão 5% da água e 42% da população brasileira. Um dos maiores problemas no Brasil, para ele, é que ainda temos o conceito de abundância de água, acreditamos que nunca vamos ter problemas com ela e por isso o seu uso ainda é feito de forma inconsciente.

"Isso se reflete tanto no comportamento das pessoas no dia a dia, como nas atividades industriais e agrícolas, as atividades são desenvolvidas com o conceito de abundância, não há a preocupação em poupar o 0 recurso", analisou.

Segundo ele, quando falamos em disponibilidade de água, precisamos pensar em quantidade e qualidade. Sempre existe a preocupação se a água vai acabar, mas na realidade isto não vai acontecer, a água sempre vai existir, o problema é que a água com qualidade adequada para ser utilizada vai diminuir em função dos problemas de demanda excessiva e de contaminação.

"Um dos grandes fatores que contribuem para reduzir a disponibilidade da água é a poluição dos rios associada ao tratamento de esgoto. Para garantir que o rio não vá ser poluído e que as suas águas permaneçam com qualidade adequada, é necessário tratar. Mas isto ainda não é uma prioridade no Brasil e por isso sofremos com problemas de esgoto sem tratamento", lamentou.

De acordo com Mierzwa, falta à população brasileira uma posição de cobrança.
"É a mesma história do lixo; se eu afasto o lixo ou o esgoto da minha casa, não vou me preocupar para onde ele foi desde que não fique perto de mim. Mas no final das contas não sabemos para onde foi este esgoto; então só coletar e afastar não são suficientes, precisamos ter a finalização que é o tratamento e nisto o Brasil está deixando a desejar", disse. "Precisamos investir mais, vamos ver se os recursos do PAC serão direcionados para o tratamento da água, o que contribuiria para a redução do problema da escassez."
Outro problema apontado pelo professor foi o desperdício de água em "perdas físicas"; a água que é tratada, mas não chega a ser consumida por ninguém.
"Em São Paulo, o desperdício de toda a água tratada chega a 18%; são canos arrebentados, vazamentos, rompimento de adutoras, etc. Precisamos nos preocupar com isto também porque representa um desperdício bastante significativo."

Acompanhe abaixo as perguntas e respostas do bate-papo.

Milena fala para José Carlos Mierzwa: Professor, o que podemos fazer no trabalho para preservar ou reutilizar a água?

José Carlos Mierzwa: Milena, em termos de redução de consumo são aquelas dicas básicas que aparecem na televisão quando temos problemas de escassez: escovar os dentes com a torneira fechada, não usar a água como vassoura para limpar a calçada, usar melhor a água. No que se refere a reuso, aproveitar a água de novo, isto exige uma estrutura um pouco mais complexa e que dificilmente acaba sendo viável em edificações que já estão prontas. Isto é mais viável para edificações novas. Em São Paulo já temos algumas empresas que trabalham com conceito tanto de conservação como reuso; hoje no mercado já existem disponíveis equipamentos (metais como válvula de descarga, chuveiro, ducha, torneiras) que economizam água. Uma dica é que o consumidor consulte na internet sites de fornecedores onde é possível conhecer os equipamentos que economizam água. Já há também vasos sanitários que utilizam menos água, como o da caixa acoplada, que economiza em até 40% da água utilizada numa residência.


Lilian fala para José Carlos Mierzwa: professor, uma das maneiras mais comuns de reuso da água em prédios e casas é através da captação fluvial para uso nos vasos sanitários. Que outras maneiras a água pode ser reutilizada em casa e em prédios?

José Carlos Mierzwa: Lilian, quando fala em água da chuva, a gente não fala em reuso - porque ela ainda não foi usada - e sim em aproveitamento. Esta é uma prática que está crescendo muito em São Paulo, basicamente se pode usar esta água para descarga, lavagem de piso, irrigação de jardim e dependendo do nível de tratamento pode ser utilizada até para lavar a roupa - muita gente alega que esta seria uma opção. Mas é preciso um cuidado especial principalmente em regiões urbanizadas onde existe um nível de poluição atmosférica maior. A água da chuva é bastante limpa até interceptar uma superfície; quando ela cai num telhado, por exemplo, onde circula gato, passarinho, rato, há uma série de contaminantes. Também há a chuva ácida, conseqüência da emissão de poluentes, principalmente da queima de combustíveis fósseis, mais problemática em regiões industriais.

Paulo fala para José Carlos Mierzwa: O óleo de cozinha é muito prejudicial ao ambiente? Qual a melhor maneira de dispensá-lo?

José Carlos Mierzwa: Paulo, o óleo é um problema sério para o ambiente, com uma gota de óleo podemos contaminar até 100 litros de água porque ele se dispersa e tem uma carga orgânica muito grande. É comum jogar este óleo na pia ou no vaso sanitário, isto além do problema ambiental traz um problema operacional para a casa porque ele entope a tubulação de esgoto. Ainda não existe nenhuma política de destinação adequada para o óleo de cozinha. Algumas pessoas, por iniciativa própria, recolhem este óleo para fazer sabão e já vi propostas de alunos para transformar este óleo em biodiesel, mas ainda não temos uma política correta do que fazer com o óleo, mas sabemos que não pode ser descarregado no esgoto porque ele tanto prejudica o sistema de tratamento, a tubulação de esgoto e o meio ambiente. Esta é uma questão que está mais relacionada À questão dos resíduos sólidos e menos com a questão da água, mas ainda precisa ser melhor estudada

Chd pergunta para José Carlos Mierzwa: teremos chances de utilizar a água do mar no futuro?

José Carlos Mierzwa: Chd, hoje a dessalinização é uma realidade também no Brasil, no nordeste várias cidades já têm equipamentos de dessalinização de água do mar por processo físico - em Fernando de Noronha e no Oriente Médio já têm. A tecnologia está se tornando cada vez mais acessível porque o desenvolvimento tecnológico permitiu que o custo caísse. E à medida que vamos tendo problemas com a qualidade da água, precisamos recorrer a tecnologias cada vez mais avançadas. Um problema que ainda temos com relação a esta tecnologia é que o Brasil ainda não fabrica as membranas, o que nos deixa dependentes da importação e sujeitos a variação de mercado, o outro é que ainda não temos nível de conhecimento técnico suficiente para garantir a eficiência da tecnologia; muitas estações no nordeste estão paradas por falta de manutenção, às vezes o poder público tem recursos para comprar o equipamento, mas não tem para manter, tecnologia avançada necessita de um acompanhamento adequado para funcionar.

Melissa fala para José Carlos Mierzwa: Antoni Gaudí é conhecido por proporcionar a reutilização da água em sua arquitetura. Tanto no Parque Güell quanto na Casa Batlló - ambos em Barcelona - ele utilizou dutos que canalizam a água da chuva para a casa ou para irrigar as terras do parque. Por que arquiteturas como esta não são mais utilizadas hoje em dia?

José Carlos Mierzwa: Melissa, esta questão do aproveitamento da água da chuva já foi utilizada, mesmo no Brasil. Se voltarmos uns 30 anos na nossa história várias pessoas faziam o aproveitamento de água de chuva, basicamente porque não havia um sistema de distribuição de água de fácil acesso ou o sistema não era confiável, então era preciso garantir uma fonte de abastecimento suplementar, por isso se aproveitava a água da chuva. Mas com o advento do saneamento, da garantia da qualidade da água fornecida por uma companhia de abastecimento, perdeu o sentido ter dois sistemas, um para a captação de água de chuva e outra para distribuição de água potável, então foi mais por comodidade das pessoas. Isto também exige um investimento que muitas vezes não compensa financeiramente, o único benefício seria ambiental, que pode ser compensado fazendo melhor uso da água.

Leopoldo fala para José Carlos Mierzwa: o que você acha do projeto pia-privada que consiste em uma pia ligada a um vaso sanitário com reservatório que se enche à medida que as pessoas usam a pia, utilizando duas vezes a água?

José Carlos Mierzwa: Leopoldo, este é um conceito usado no Japão, por exemplo, a própria cuba do lavatório acaba alimentando a caixa acoplada para dar descarga. Isto vai depender do local, se não houver uso de produtos químicos associados como sabão, detergente, pasta de dente é uma prática que seria adequada. O problema é quando você começa a usar produtos químicos junto, porque começa a deteriorar a qualidade da água e vão ocorrer problemas de manutenção da caixa e também problema estético, na aparência da água que você vai dar descarga. A água com sabão vai se deteriorar e pode gerar problemas de odor, fica turva. O brasileiro não avalia isto como um aspecto de limpeza, isto começa a trazer problemas do ponto de vista cultural de aceitação. É uma opção que pode ser utilizada, mas precisa ser avaliada com critério.

Aquático fala para José Carlos Mierzwa: Em vários países da Europa é comum ver pratos sendo deixados de molho antes de serem lavados? Esse é um jeito eficiente de lavar pratos? Parece-me ser anti-higiênico.

José Carlos Mierzwa: Aquático, a função da água é remover a sujeira, embora pareça anti-higiênico, a água que é um solvente universal vai soltar a gordura o que vai facilitar a limpeza depois. A limpeza final é para garantir a higienização, então é correto e se gastaria menos água do que pegar um prato cheio de gordura, colocar embaixo da torneira e tentar remover tudo.

Sujinho fala para José Carlos Mierzwa: como está o nível de poluição dos oceanos?

José Carlos Mierzwa: Sujinho, esta é uma pergunta bastante difícil de responder, mas o que podemos avaliar é a qualidade da água no litoral, próximo às cidades, mas isto vai depender muito da forma que é tratado, coletado e disposto o esgoto. Temos vários problemas na costa brasileira, inclusive em cidades turísticas onde o esgoto sem tratamento adequado acaba sendo lançado e vai parar nos canais, nos rios e contamina as praias. Na década de 80, a situação do litoral paulista era crítica e ninguém queria ir para lá, justamente pela questão da coleta e afastamento do esgoto. Na medida em que você melhora as condições de saneamento básico, você melhora a qualidade do litoral.

Luisão Pereira fala para José Carlos Mierzwa: Em prédios exclusivamente comerciais, que dica é boa para economizar água?

José Carlos Mierzwa: Luisão Pereira, prédios comerciais são um pouco complicado, o ideal para minimizar o desperdício é utilizar equipamentos hidráulicos "economizadores", mas à medida que você sofistica a tecnologia, você precisa sofisticar o procedimento de manutenção. O ideal é trabalhar com equipamentos simples; mas se quiser sofisticar, precisa se preparar para investir em manutenção.